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Hapvida é condenada após negar quimioterapia a homem com câncer raro


Rafael Sá Belchior (Foto: Arquivo Pessoal)

.Mesmo com uma sentença judicial, o plano de saúde Hapvida NotreDame Intermédica vem negando a um paciente com um câncer raro a realização de quimioterapia no Hospital Oswaldo Cruz, em São Paulo, onde ele tem cobertura, passou por cirurgia e iniciou o tratamento.

Procurada, a Hapvida diz que está cumprindo a decisão judicial, o que o paciente nega.

O que aconteceu

.O advogado Rafael de Sá Belchior, 36, foi diagnosticado em dezembro do ano passado com um tumor no rim que se espalhou para o fígado. Os médicos que diagnosticaram o tumor raro —conhecido como sarcoma de Ewing de partes moles— recomendaram ao paciente que utilizasse o convênio médico para se tratar no Hospital Oswaldo Cruz, referência em tratamento de tumores raros.

Ele atinge um a cada 2 milhões de pacientes com câncer. Na região que tive, só tem registrado 260 casos no mundo, segundo meu urologista.
-Rafael de Sá Belchior

.Belchior passou por cirurgia no Oswaldo Cruz em janeiro, quando os médicos recomendaram 14 ciclos de quimioterapia. Os dois primeiros ocorreram sem problemas. No terceiro ciclo, porém, a Hapvida emitiu a guia de autorização, mas não pagou o hospital, segundo o paciente. "[O Oswaldo Cruz] me cobrou a quimio e três doses de uma injeção que preciso tomar toda a vez que a imunidade cai".

.Depois da quimio, Belchior costuma sentir neutropenia febril: uma febre alta causada pela redução dos neutrófilos, as principais defesas do corpo contra as infecções bacterianas e por fungo. Após duas internações por neutropenia febril, a equipe médica indicou uso de antibiótico preventivo e injeções.

Pedi as injeções para a Hapvida, que negou. Como não pagam, passei a gastar R$ 400 por mês, em média, com as injeções.
-Rafael de Sá Belchior

.Em abril, o plano voltou a negar quimio no Oswaldo Cruz. "Eles queriam que eu fizesse o tratamento na rede própria da Hapvida, mas quero continuar no Oswaldo Cruz porque tenho cobertura, é referência em tratamento de tumores raros, inclusive para o meu tipo de câncer, e tem um centro especializado em oncologia, com assistência diária da equipe médica."

.Diante da negativa, Belchior procurou a Justiça em maio. No mesmo mês, uma juíza concedeu liminar (decisão provisória) obrigando a Hapvida a bancar todo o tratamento no Oswaldo Cruz, incluindo medicação, internações e procedimentos por complicações da quimio.

.O plano recorreu da liminar e perdeu. Em agosto, a liminar virou sentença. A Hapvida recorreu e aguarda novo julgamento.

Justiça mandou Hapvida pagar

.Mesmo com a liminar, a Hapvida negou a quimio de junho. "A Hapvida recebeu o pedido, deixou em análise até outubro, quando negaram oficialmente. Só soube disso porque recebi a nota de cobrança do hospital", diz o paciente.

.Advogado especializado em saúde, Rafael Robba (Vilhena Silva Advogados), diz que a liminar já obrigava a operadora "a cumprir a decisão". "Ela não pode dizer que não vai cumprir porque quer aguardar o trânsito em julgado [quando acaba a possibilidade de recorrer]", explica o advogado. Como a liminar foi confirmada em sentença de primeira instância, o especialista explica que essa obrigação da operadora é reforçada.

Como houve recurso, o Tribunal de Justiça pode ou não reformar a sentença, mas até lá a atual decisão continua vigente: a operadora tem obrigação de cumprir.
-Rafael Robba, advogado

.Em julho, depois de esperar por mais de 11 horas pela autorização, Belchior diz que pagou uma "caução de R$ 15 mil ao hospital para o ciclo de quimio".

Em agosto, tive queda de plaquetas e precisei passar na emergência. Mesmo com a decisão judicial, a internação foi negada e precisei pagar R$ 2.900 porque poderia morrer.
Rafael de Sá Belchior

"Hapvida me procurou após vídeo viralizar"

.Após nova negativa para a quimioterapia de setembro, diz Belchior, ele compartilhou um vídeo que viralizou em uma rede social. "Faltando 20 horas para a minha internação, o convênio ofereceu R$ 39,3 mil para cobrir a quimio daquele mês", diz. "Mas precisei de duas transfusões de plaquetas, que somadas me custaram mais de R$ 12 mil porque não pagaram."

.Descontando o que já paguei e o que me depositaram, estou devendo cerca de R$ 96 mil. Passo tudo no cartão com ajuda da família. Desde que fui afastado pelo INSS, minha renda caiu muito e, sem ajuda, a conta não fecha.
Rafael de Sá Belchior

"O tratamento foi oferecido desde o início em nossa rede própria, com todo suporte para o seu quadro clínico", diz a Hapvida em nota. Apesar da dívida de Belchior, a empresa afirma que "tem arcado com os custos" do tratamento no Oswaldo Cruz "após acerto com o paciente e seu advogado, e em cumprimento à ordem judicial".

"Um dos diferenciais da companhia é o atendimento integrado em sua rede própria, onde é possível garantir segurança da qualidade assistencial, acompanhamento mais assertivo dos resultados e contato mais próximo com os pacientes", diz a Hapvida.

"Tentou me tirar à força do hospital"

.No fim de outubro, sua médica pediu ao convênio autorização para internar Belchior "sob risco de óbito". O convênio negou, mas o advogado se internou mesmo assim. Já no Oswaldo Cruz, "a Hapvida mandou uma ambulância para me transferir à força para um hospital próprio", diz.

."A equipe subiu até o andar e só não invadiu o quarto porque os enfermeiros não deixaram", afirma Belchior. "Precisei chamar a polícia. Quando ela chegou, minha esposa ligou a câmera do celular e a policial perguntou: 'Vocês vieram pegar o Rafael?', e eles foram embora na hora. Abri um boletim de ocorrência na PM e na Polícia Civil."

."Sou casado, tenho uma filha de 2 anos completados em outubro", diz. "A minha briga é por elas, pela minha mãe que já perdeu meu pai para o câncer. Eu preciso lutar para viver porque não posso deixá-las."

O tratamento já é pesado e mesmo assim tenho de lidar com o plano. Só quero que eles cumpram o direito reconhecido pela Justiça para que eu consiga ter um pouco de paz na minha luta pela vida. Que eu só lute contra a doença e não contra um plano de saúde também.
-Rafael de Sá Belchior

Fonte: UOL Notícias

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