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Produtor da cultura da periferia, Leo Suricate acredita na arte como resistência e sobrevivência

Leo Suricate conversou com a Frisson sobre sua trajetória na internet e o que a cultura da periferia significa. Confira a entrevista completa

Foto: Lino Vieira

Uma hora Leo Vetin, outra hora Leo Suricate. A mudança de nome é a prova que o influenciador e articulador cultural Leo vive seus projetos artísticos até no nome. O artista é conhecido por ter sido um dos fundadores da página Suricate Seboso, fundada em 2012 no Facebook e que tratava os costumes, sotaque e acontecimentos cearenses com humor 

O sucesso da página abriu espaço para novas produções, novas perspectivas e uma chance para colocar a cultura da periferia de Fortaleza em destaque. Dessa ideia, nasceu a Vetinflix, produtora responsável pela “La Casa Du’z Vetin”, paródia do seriado “La Casa de Papel” que conta com artistas do Jangurussu, bairro da Capital. 

Leo Suricate conversou com a Frisson sobre sua trajetória na internet e o que a cultura da periferia significa. Confira a entrevista completa: 

Frisson: Você começou a crescer com sua página Suricate Seboso, certo? Pode falar sobre a criação da página e como foi o seu crescimento?

Leo Suricate: O Suricate Seboso surgiu em 2012, no Facebook, com o Diego Jovino, meu amigo há mais de 20 anos e que é quem também criou a página de humor Fortaleza Ordinária, no Instagram. O sucesso do Suricate foi tão imediato que em uma semana chegou a 100 mil seguidores. Meu irmão, Dudu Suricate, entrou na segunda semana para criar conteúdo para o Twitter. Um mês depois e mais vários novos seguidores, eu entrei para criar conteúdo para o Youtube. Foi tudo muito rápido, muito cedo. Era um conteúdo simples, com a cara do cearense, que fazia com que as pessoas se identificassem de imediato. 

Frisson: Você foi, aos poucos, se tornando um influenciador e promotor cultural na Cidade. Quando percebeu que tinha virado um nome forte na cultura da cidade? 

Leo Suricate: Eu sempre fui produtor cultural na periferia, até mesmo antes da internet. Sempre fui de produzir sarau, show, espetáculo de forma independente. Depois da Vetinflix, o fluxo das produções aumentou e com a internet o reconhecimento foi chegando aos poucos, pessoas que gostavam do meu trabalho e outras interessadas em cultura de periferia. Acredito que percebi que tinha relevância em 2021, no evento Caravana Cultural, que trazia o ex-presidente Lula a Fortaleza. Lá, ao lado de inúmeros outros artistas e mestres da cultura, não só fui convidado a falar em nome da cultura, como existia uma expectativa na minha fala. Depois disso, a aproximação com o Secretário de Cultura, Fabiano Piúba, e com o próprio Governador Camilo, que se interessavam em saber o que eu acho das políticas públicas me fizeram entender que uma chave tinha virado.

Frisson: Você tem usado sua influência para falar sobre a cultura da periferia. Pode explicar o que significa essa cultura? 

Leo Suricate: Cultura de periferia é o que nasce nas bordas, nas margens da sociedade, é política de transformação, é quem leva a periferia pro centro, pro lugar do debate. Quando isso acontece, tudo muda, tudo ganha outros resultados, outras possibilidades. Essa é a cultura que modifica verdadeiramente a política, o mercado, o consumo e as tendências. Anitta, por exemplo, hoje tá no topo, mas há dez anos atrás, tava levantando a bandeira do funk no piscinão de ramos. A partir disso, muita coisa mudou, muitas possibilidades foram criadas.

Frisson: Como a cultura da periferia resiste na Cidade? Pode falar de alguns nomes de Fortaleza que a representam? 

Leo Suricate: Ela resiste simplesmente acontecendo, sendo feita, independente, de qualquer coisa. Porque se a gente pode é impedido de entrar em uma porta, se negam espaço, se o Governo não chega até nós, a gente faz o nosso do mesmo jeito, a gente inventa. É cultura de guerrilha, porque a periferia vive é de cultura. É uma questão de sobrevivência. E a internet facilitou isso. Posso citar artistas incríveis que são da periferia: Guilherme da Fortal, Terroristas Del Amor, Pobretion, Princesinhas de Favela, Batuta, Mateus Fazeno Rock, Luiza Nobel... E não é só na periferia urbana não. No interior também tem muita gente: Fluxo Marginal e a banda Procurando Kalu são exemplos.

Frisson: Podemos imaginar que a cultura da periferia do Rio de Janeiro, por exemplo, é diferente da do Ceará. Quais são as características regionais do trabalho produzido aqui? 

Leo Suricate: A fala, o sotaque, o humor. Até o clima conta, as características naturais, o fato de morarmos em uma planície, nosso corpo franzino... isso impacta na estética. Fora que a gente tem um acúmulo cultural que é ancestral, porque apesar da internet e da urbanidade, a gente tem um passado de sertão, de interior, principalmente nós, de periferia, que muitas vezes crescemos criados por nossas avós, mulheres que vieram do interior. Até as facções criminosas influenciam na nossa forma de fazer cultura em Fortaleza.

Frisson: Você é integrante do Vetinflix e é um dos criadores da “La Casa Du’z Vetin”. Pode falar sobre a criação da série? 

Leo Suricate: A série nasceu em 2019, no José Euclides, conjunto habitacional onde moro, no Jangurussu. Lá, reunimos artistas e influenciadores pra tomar umas, jogar conversa fora e também pensar em produções e, assim, gente decidiu que ia criar um selo de produção, que é a Vetinflix. No meio desses encontros, resolvemos criar a série que seria a paródia da La Casa de Papel, onde os bairros de Fortaleza se uniriam, uma maneira de criar uma pacificação, resolver problemas territoriais. Nada confirmado. Fizemos uma foto e postamos, a imagem viralizou, todo mundo começou a comentar e a dizer que faríamos a série e aí não teve mais jeito. O primeiro episódio foi lançado na Praia de Iracema, um cinema ao ar livre, com 5 mil pessoas. Nenhum episódio de violência, nenhum conflito com polícia.

Frisson: A série teve quatro episódios, certo? Há previsão para mais temporadas? 

Leo Suricate: A série tem 5 episódios. O quinto e último da primeira temporada sai em junho. Queremos fazer a segunda temporada, mas isso vai depender de recurso de edital.

Frisson: Há outras produções previstas pela Vetinflix? Ou outros produtos audiovisuais de sua autoria? 

Leo Suricate: Com a Vetinflix, a ideia é fazer mais uma temporada da La Casa Duz Vetin e a série Yanovets. Paralelo a isso, vou codirigir o novo clipe do Baiana System, da música Catraca, junto com a Renata Monte e a Mumutante. Tem também um clipe do Rapadura, que tá prestes a ser lançado, e o meu primeiro disco, que vai contar com um álbum visual, se chama “Sangue no zói”. Ainda no primeiro semestre, também vai ser lançado o manifesto do Movimento Difavela que faço parte, e produções coletivas através desse movimento. No Jangurussu, a gente tá trabalhando para a instalação do Centro de Audiovisual e Tecnologia, em três contêineres que vão ser instalados lá no José Euclides. E já tem curso pronto pra ser iniciado, que é a Escola de Influenciadores, em parceria com a Secretaria da Juventude, com aulas nas áreas de produção audiovisual, redes sociais, produção musical, câmera, edição de vídeo e produção cultural.

Frisson: Música, escrita, audiovisual. Você acabou passando por várias áreas da cultura. Qual a sua favorita e por que? 

Leo Suricate: Audiovisual, porque é uma arte aglutinadora. Além de juntar escrita e música, ela é capaz de acumular pessoas.

Frisson: Todas essas produções e trabalhos possuem também um papel social, principalmente junto às pessoas da periferia. Pode explicar como acredita que seu trabalho impacta a Cidade? 

Leo Suricate: Eu acho que a minha figura impacta, principalmente, meninos da periferia, porque faz com que as pessoas acreditem que também podem realizar coisas. O realizar é muito importante, talvez por isso que eu me bote pra fazer tantas coisas diferentes, de jornalzinho a dirigir um clipe. Costumo dizer que é como um rodízio de comida em restaurante. Quando a gente não tem oportunidade de frequentar sempre, a gente quer botar um pouco de tudo, do sushi ao churrasco. Eu também quero experimentar de tudo o que eu puder. Não é sobre ter seguidor, é sobre ter pessoas que acreditem na força do meu trabalho.

Frisson: Como a pandemia teve influência no seu trabalho ou ainda na própria cultura da periferia? Houve alguma comunicação e auxílio por parte do poder público?

Leo Suricate: No começo da pandemia, em 2020, eu botei cinco pessoas pra morar comigo e minha namorada. A ideia era se isolar junto e “tacar o pau” a produzir, porque a gente sabia que dentro de casa, as pessoas só iriam ter a internet como entretenimento. Nossa primeira live, à meia noite, tinha mil pessoas assistindo. Todo dia, a gente criava alguma coisa. O resultado disso são milhões de seguidores. No meio disso, participamos do Edital Dendicasa e algumas pessoas receberam auxílio emergencial. Daí fomos contratados para criar uma campanha de como se cuidar e se proteger do Coronavírus, uma ação do Governo do Estado.

Frisson: Qual o seu objetivo, enquanto criador e influenciador?

Leo Suricate: Meu objetivo é ser uma plataforma de realização, uma plataforma de produção e multiplicação de cultura do meu entorno. Não tenho uma realização pessoal, um sonho muito distante, eu só quero mobilizar pessoas. O Ceará é uma grande usina de produção e quero chegar lá fora e mostrar pro mundo que o que a gente faz aqui é revolucionário.

 

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